sábado, 11 de fevereiro de 2017

Fonte seca, vazia

   Li a carta mais uma vez pra poder me situar. "Estou fazendo isso pois ainda vejo potencial em você. Me perdoe." Eu não quero perdoar. Tanto tempo juntos e de repente tudo acaba por causa do meu maldito talento desperdiçado? Talento esse que nunca fora reconhecido por alguém que não fosse do meio de convívio, por alguém que não enchesse meu ego por medo de um eventual suicídio, por alguém que sempre disse que me amava querendo algo em troca. E o que queria no final das contas? Eu dei amor, eu dei meu tempo, eu dei tudo de mim e por Deus, até feliz eu fui! Eu me entreguei, mas não fui o suficiente.
   Nas tantas vezes em que me expressei de maneira poética a ponto de mostrar o meu carinho, tua resposta era uma lágrima. Uma única lágrima que brotava tão cruel no olho esquerdo e morria no chão. Eu, iludido, achava que tinha atingido seu coração, quando na verdade, ilusório, massacrava seus ideais de estar com alguém importante o suficiente para transmitir tais palavras para mais de uma pessoa. "Não faça só para mim, faça para o mundo!", você insistia. "Você é meu mundo...", eu dizia. Dormíamos em quartos separados.
   Agora eu tenho duas folhas cheias de justificativas e um final nada feliz. Seguro-as com escárnio, como se tivessem sido escritas pelo próprio diabo. Quem me dirá que não foram? Tantas ideias, tantas imagens, teu rosto se forma na minha mente e uma única frase se repete na minha cabeça: "Minha inspiração se foi". Procuro nas minhas obras algo que não seja relacionado a você, mas tudo, absolutamente tudo é sobre você. Eu sorrio com vergonha de mim mesmo, "Talento é o caralho!" Tanto tempo, tantas obras, tudo a mesma coisa com maneiras diferentes de expressar. Agora eu entendo aquela lágrima. Agora eu choro aquela lágrima. "Pro inferno com a tua sabedoria, meu amor... Te vejo lá"

      
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   Abro a porta e todas as folhas, um dia cheias de arte, estão pintadas de vermelho. A casa cheira à poesia crua, e isso me assusta. Corro para o quarto e me deparo com o corpo no chão. 'Finalmente você teve o seu final poético, não é mesmo?' Coloco "Wouldn't It Be Nice" pra tocar enquanto recolho todas as obras que contém algo sobre mim... É o mínimo que posso fazer.

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