quinta-feira, 18 de janeiro de 2018

1+1+1=2

   Desceu as escadas com pressa. Chave na mão, casaco fechado e lágrimas nos olhos. Passou pelas pessoas sem dar atenção, correu até seu carro e não quis saber de respeitar o limite de velocidade do estacionamento do condomínio. Foda-se se iriam lhe dar multa, só queria sair de lá. Tomou a esquerda e ao passar por um buraco pôs-se a chorar. Soluçava, gemia, mas não parava de acelerar. Ignorava as cores dos sinaleiros e as buzinas, apenas aumentava a velocidade e enxugava as lágrimas que lhe embaçavam a visão. Era julho, o frio estava no seu ápice, mas a pressa e o choro ininterrupto faziam sua testa suar.
   Dentro de poucos minutos o choro passou e o terror tomara conta de seu corpo. Suas mãos tremiam, as pernas estavam bambas, a cabeça latejava demais. Zigue-zagueava pelas ruas com um destino em mente, nas não queria chegar lá. A chuva então começou a cair, forte, pesada, mas seu limpador de parabrisa não funcionava há meses. Enxergava muito pouco, quase nada, o que fez com que perdesse a entrada à esquerda. Pisou ainda mais forte no acelerador, fazendo o carro roncar alto demais pela ausência de troca da marcha. Não conhecia aquele caminho, mas desde que havia saído de sua cama não sabia mais qual caminho tomar.
   Já haviam se passado duas horas desde que havia saído de sua casa. Estava de frente a um viaduto. Farois desligados, motor desativado, apenas o som da tempestade no vidro traseiro do carro e a voz pouco emblemática de Gwineth Paltrow embalavam seu devaneio mental. Olhava pro nada pensando em tudo, as lágrimas já haviam secado, mas a dor da sua certeza  demoraria uma vida inteira pra passar. Quando acordou, algumas horas mais tarde, a chuva já havia cessado, bem como sua vontade de fugir. Ligou o carro, aumentou o volume do rádio até sua capacidade máxima e voltou para casa cantando em histeria. Sua direção era calma, mas seu estado emocional nem um pouco. Entrou no portão nos primeiros raios do sol, guardou seu veículo, subiu as escadas, abriu a porta e decidiu de uma vez por todas encarar sua realidade.
   Em sua cama haviam ainda duas pessoas. Uma ele amava, a outra não mais. Estavam em sono profundo, dormindo a uma certa distância, então se encaixou no meio para refletir sobre sua decisão. Começou a sussurrar sua mais nova verdade, então a falar, quase gritar, o que fez despertar os dois lados da cama. Recebeu olhares de sono e confusão, então se pôs de pé e explicou o que havia feito na noite passada. O cansaço tomava conta, seu corpo estava implorando por descanso, mas precisava dizer aquilo ali e naquele momento. Quando terminou de falar, saiu do quarto e deixou a vida decidir o que aconteceria dali pra frente. Sentou-se no sofá da sala, tirou o casaco e se pôs a esperar com as mãos no rosto. Pouco tempo depois um vulto passou pela sala e saiu pela porta sem se despedir. Ergueu a cabeça, mas não quis olhar pela janela pra ver quem havia saído. Tirou os tênis e a calça, respirou fundo e voltou para o quarto. Na sua cama seu amor ainda estava com lágrimas nos olhos, mas de braços abertos, cicatrizes expostas, com disposição pra perdoar e seguir em frente, como sempre fizeram. Entendeu que poderia ser feliz assim, sorriu discretamente, abriu seus braços e sentou-se na beirada da cama. Olhou pra trás e com muita confiança soltou seu mais exausto "Eu te amo". Pela primeira vez naquele colchão, mentiu.

Nenhum comentário:

Postar um comentário